O que eu teria dito na CPI da Pandemia?

T. Ayub
3 min readOct 19, 2021
O que eu teria dito?

A CPI da Pandemia ouviu hoje em sessão solene mais um conjunto de testemunhas dos mesmos crimes que já temos acompanhado. Mas de um ponto de vista novo: o dos familiares das vítimas. Sou sortudo pois perdi apenas — se é que dá para dizer apenas — colegas e amigos nessa pandemia. Ninguém do meu convívio íntimo. Nem de longe eu teria espaço para lá falar mas minha mente é imaginativa: e se eu tivesse lá na frente do microfone, o que eu diria? Me veio à mente como filme o que relato a seguir.

Eu explicaria aos presentes que a origem da palavra parlamento é do francês parle, falar. O que se faz ali é falar. E dos que falaram, ouvimos as mais chocantes revelações e constatações sobre um desenrolar de fatos que nos conduziram até 600 mil mortos. Mas que na minha vez eu faria diferente: em vez de me comunicar falando, me comunicaria com silêncio. E anteciparia a todos que eu faria dois pedidos incomuns.

O primeiro é que todos ficassem de pé não apenas para 1 mas para 2 minutos de silêncio. Mostraria na mão um cronômetro para indicar que eu seria rigoroso com o tempo. O segundo pedido é para que prendessem a respiração no primeiro segundo e a segurassem o máximo possível. E ao soltarem o ar e voltarem a respirar, que se sentassem em silêncio até o final da contagem.

Já nos primeiros 30 segundos mais da metade já deve ter se sentado. Poucos estariam de pé ao final, já que 2 minutos é o tempo médio que um adulto saudável e não sedentário consegue ficar sem respirar, informação que eu traria com o apitar do cronômetro.

Essa vivência foi o que consegui pensar ao me lembrar de uma reportagem da Globo que penosamente acompanhou uma cidade do Amazonas ver seu estoque de oxigênio hospitalar prestes a acabar. Na manhã seguinte chegaram reforços mas apenas 7 minutos depois do esgotamento, o que provocou a morte simultânea de dezenas de amazonenses por falta de ar. Para quem aceitou meu convite destes 2 minutos, imagine o que foi viver esses 7 minutos sozinhos num leito de hospital e isolado da família. É isso que fizemos com 600 mil brasileiros nos últimos 2 anos, alguns com mais conforto outros menos mas, os matamos por falta de ar.

Quando eu lecionava biologia eu dizia que o responsável pela dengue não era um vírus nem um mosquito. Estes faziam o que sua biologia determinava. Os reais responsáveis são a preguiça e o individualismo. Da mesma forma, o que eu espero do relatório desta CPI é a listagem dos culpados por todas estas mortes e a proporção da culpa de cada um.

Então eu exibiria o vídeo a seguir e ao término dele, agradeceria pela atenção de todos e me sentaria em silêncio.

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T. Ayub

Me chamo Ayub e "Eu faço a internet funcionar", nome do meu canal no YouTube: http://youtube.com/c/ayubio